quarta-feira, 14 de novembro de 2018

"URZE"

De uma cepa fiz um pião,
de fios de linho fiz um cordel
num talego vazio sem farnel
para a merenda não havia pão!

Sempre houve e há descontentamento,
sempre houve e haverá arrogância,
a viajar, continuam no pensamento
 lembranças, essas, da minha infância!

Nada disso estou inventando,
sem azeitonas um corno vazio
pelas faces corriam-lhe a fio
lágrimas dos olhos chorando!

Um alentejanito dizia,
tenho fome, ó! mãe dá-me pão
nos olhos, com lágrimas de tristeza,
magoado sentindo o seu coração
não filho! Sua mãe respondia. . .
O pão é para o teu pai comer
logo à noite, quando chegar do trabalho
com um feixe de lenha enfiado na cabeça!
(Edumanes)
"Em algumas zonas do Baixo Alentejo. Era costume os homens à noite regressarem do trabalho com um feixe de lenha às costas.  Para acenderem o lume e nele, ao serão, se aquecerem".

segunda-feira, 12 de novembro de 2018

"ALENTEJANISMOS...COM TRADUÇÃO"

Texto que Maria Florindo, professora do 1.º ciclo do Ensino Básico e da Universidade Sénior de Évora, publicou no jornal alentejano Tribuna Alentejo (14/08/2014), acerca dos regionalismos alentejanos.


Eu - Abalei às 15h…

Ele - Tu o quê??

Eu - Abalei…

Ele - O que é isso?

Eu - Ora, fui-me embora…

Todo o bom alentejano “abala”, para um sítio qualquer, que normalmente é já ali. O ser já ali é uma forma de dizer que não é muito longe, mas claro que qualquer aldeia perto aqui no Alentejo está no mínimo a cerca de 30km. Só um alentejano sabe ser alentejano!

Um alentejano “amanha” as suas coisas, não as arranja, um alentejano tem “cargas de fezes”, não tem problemas, um alentejano vai “à do ou à da…” não vai a casa de…, um alentejano “inteira-se das coisas” não fica a saber… No Alentejo não há aldrabões há “pantomineiros” e aqui também não se brinca, “manga-se”.

No Alentejo não se deita nada fora, “aventa-se” qualquer coisa e come-se “ervilhanas” ou “alcagoitas” (amendoins) e “malacuecos” (farturas). Os alentejanos não espreitam nada nem ninguém, apenas se “assomam”… E quando se “assomam” muitas vezes podem mesmo ter dores nos “artelhos” (tornozelos)!

As coisas velhas são “caliqueiras” e muitas vezes viaja-se de “furgonete” (carrinha de caixa aberta), algo que pode deixar as pessoas “alvoreadas” (desassossegadas). Quando algo não corre bem, é uma “moideira” (chatice) e ficamos “derramados” (aborrecidos) com a situação, levando muitas a vezes a que as pessoas acabem por “garrear” (discutir) umas com as outras e a fazerem grandes “descabeches” (alaridos).

“Ainda-bem-não” (regulamente) as pessoas têm que puxar pela “mona” (cabeça) para se desenrascarem quando muitas vezes a solução dos seus problemas está mesmo “escarrapachada” (bem visível) à sua frente.

Não estou “repesa” (arrependida) de ter escrito esta pequena crónica, com vista a lembrar detalhes do património oral que nos é tão próximo e muitas vezes de “bradar” aos céus. “Dei fé” (pesquisei) a algumas expressões e tentei não vos criar, a vós leitores, uma grande “moenga”, apenas quero que guardem algumas destas expressões na vossa “alembradura” (lembrança)!

sábado, 10 de novembro de 2018

"MESMO, EM TEMPO DE PAZ"

Quem na incerteza
 espera desespera,
 à conta da pobreza
 a riqueza prospera!

Na terra semeadas,
cantarolando mais bela
se torna a vida no campo
sobre flores e verdes searas
vendo as borboletas voando
já pensando na Primavera
ainda agora no Outono!

Há coisas que não sendo capaz,
entre aquelas que não percebo
uma delas é os soldados da paz
 declararem guerra ao governo?
(Edumanes)

sexta-feira, 9 de novembro de 2018

"A TENDA DO JOÃO"

Quatro alentejanos costumam ir pescar há muitos anos, sempre na mesma época, montando um acampamento para o efeito.

Este ano, a mulher do João bateu o pé e disse que ele não ia. Profundamente desapontado, telefonou aos companheiros e disse-lhes que, desta vez, não podia ir porque a mulher não deixava.

Dois dias depois, os outros chegaram ao local do acampamento e, muito surpreendidos, encontraram lá o João à espera deles e com a sua tenda já armada.

– Atão, João, comé que conseguisti convencer a tua patroa a deixar-te viri?

– Bêm, a minha mulheri tên estado a ler “As Cinquenta Sombras de Grey” e, ontem à nôte, depois de acabar a última página do livro, arrastô-me para o quarto. Na cama, havia algemas e cordas!

Mandô-me algemá-la e amarrá-la à cama e opois disse: Agora, faz tudo o que quiseres…


E Ê … VIM PESCA

sexta-feira, 2 de novembro de 2018

"PATO MARRECO"

Já não se ouve o Cuco cantar em Março,
nem a Rola se ouve como se ouvia em Abril,
 outrora no Monte de Alguidares de Baixo
  como símbolo à entrada tinha um canzil!

Diziam que era de uma canga,
que não estava sendo utilizada
no cachaço dos bois ganhou fama
sem penalizações foi reformada!

A um passo de gigante,
no Monte do Vale Travesso
havia uma Vaca elegante
e um Pato Marreco!

Uma galinha coscuvilheira,
um Papagaio e um Melro.
Estranhando a certa altura
por não ouvir o Melro cantador,
o papagaio resolveu porventura
perguntar à galinha coscuvilheira
se sabia onde estava o impostor!

Cua cua, interveio o Pato Marreco,
aqui no Monte ouviram-se rumores cua cua
que esse mariola por se armar em esperto
esteve na gaiola mas já lá não estará?
(Edumanes)

quinta-feira, 1 de novembro de 2018

"LOCOMOTIVA A VAPOR"

Hoje, estou aqui recordando. Muitos anos se passaram.  Há mais de meio século.  Era como é hoje dia de Todos os Santos. Com a saudade e a incerteza de voltar ou não ao cais marítimo de onde partimos. De Nacala com destino a Vila Cabral, nos confins do Norte de Moçambique. Viajava-mos num comboio cuja a locomotiva era movida a vapor. Chegamos lá no outro dia, ao princípio da noite, com chuva normal. Eram p'raí sete e picos oito e coisa nove tal. 
 Desejo um bom dia de Todos os Santos, a todos aqueles que por aqui passarem, bem como aos que .por motivo de força maior não o possam fazer!

segunda-feira, 29 de outubro de 2018

"COMERAM TUDO"

Não sei, não quero saber,
do que não me diz respeito
 não tenho gostava de ter
inspiração para escrever
poemas do amor perfeito!

Mas, sem ela não consigo,
tão pouco escrever o mote
também e, porque acredito
estou esperando que volte!

Hoje acordei aporrinhado,
bem acompanhada ou não
já a não vi em nenhum lado
 nem de pijama nem dempelão!

Quem sem preocupação vive a vida em paz d'alma,
tanto se lhe dá que a água corra para cima ou para baixo
 como qualquer pançudo nunca de abundância se farta
 também nunca o comilão pretende largar o tacho?
(Edumanes)

domingo, 28 de outubro de 2018

"NUM DIA DE PRIMAVERA!

Fui a Beja sozinho, mas
de lá sozinho não voltei
guardada no coração
por quem me apaixonei
de lá voltei com a paixão!

Se essa paixão se amuar
 a saudade não se aborreça
a vontade de lá voltar
agora, não me sai da cabeça!

Pelo caminho da felicidade,
qualquer dia, estou pensando
até que apareça a oportunidade
com a esperança vou andando!

Com o desejo de lá chegar,
ainda antes do nascer do sol
se no caminho não atrapalhar
 a presença do vagaroso caracol!

Sem pressa parado a olhar,
para as borboletas voando
vendo as formigas a trabalhar
ouvindo as cigarras contando!
(Edumanes)

sexta-feira, 26 de outubro de 2018

"NO CÉU AZUL BRILHA O SOL"

Se quem vive não vivesse,
vozes do bem nem do mal ouvia
ninguém perde o que nunca teve
vive triste quem não tem alegria!

Seguindo as estrelas,
com o destino vou andando
do meu caminho as tristezas
 enquanto posso afastando!

No Céu de dia, dourado, vejo o Sol,
à noite as estrelas e a Lua prateada
amarela vejo a flor do girassol
castanhos os olhos da minha amada!
(Edumanes)

quarta-feira, 24 de outubro de 2018

"VESTIDAS DE LUTO"

Na Cerca das Oliveiras,
viviam duas gaiatas
usam brincos nas orelhas
nos pés calçavam chanatas!

Penso, não tenho a certeza,
cuecas usavam debaixo da saia
para mostrarem a sua beleza
 só de biquíni andavam na praia!

Na cerca havia alegria,
elas riam à gargalhada
como em redor não se via
outra, assim, tão animada!

Um dia as duas desarvoradas,
para onde não se sabe, foram embora
não mais se ouviram como outrora
lá na cerca as suas gargalhadas!

Não se sabe onde estarão,
nenhuma delas mais voltou
juntamente, com a solidão
 na cerca o silêncio se instalou!

Já não parece a mesma d'outrora,
de noite e de dia, sem a sua presença
as azeitonas cada uma suas lágrimas chora
vestidas de luto sentem a sua ausência!

Todos as querem de volta,
sem mais demora para a cerca
pode ser que a qualquer hora
com elas a esperança apareça?
(Edumanes)